O Setembro Amarelo é um mês assim denominado, para aumentar a conscientização sobre a prevenção do suicídio, da depressão e da saúde mental. Esse destaque se justifica? Nessa postagem eu tenciono responder a esse questionamento, mas de um ponto de vista raramente mencionado: o da dor crônica.
“Nunca despreze as pessoas deprimidas. A depressão é o último estágio da dor humana.”
Para começar, depressão e saúde mental estão intimamente associadas com a dor crônica.1[Internet] Journals.lww.com. Acesse o link.
O quanto a depressão – uma doença crônica, lembremos – alimenta a dor crônica, ou o contrário, é matéria de controvérsia. A mesma que cerca o ovo e a galinha. Sabe-se, sim, que a relação é de duas mãos: a depressão pode causar dor – e a dor pode causar depressão. Às vezes, criam um ciclo vicioso no qual a dor piora os sintomas da depressão e, em seguida, a depressão resultante piora a sensação de dor. Em muitas pessoas, a depressão causa sintomas físicos inexplicáveis, como dores nas costas ou de cabeça.
Então, a dor da depressão existe?2[Internet] Pepsic.bvsalud.org. Acesse o link.
A medicina ainda carece de evidências cientificamente extraídas para afirmar tal coisa. Porém, gostem os fanáticos da Medicina por Evidências ou não, a vida real não é só feita de evidências sacramentados em estudos populacionais ou experimentais. Se a dor do luto, comentada noutra postagem, pode ser evidentemente preocupante para a saúde física, por que a dor da depressão não o seria? Dizer estar “sofrendo emocionalmente”, não tem um sentido apenas metafórico: a depressão profunda é severamente dolorosa, e eventualmente letal.
Poucos que sofrem deste mal tentam ou morrem por suicídio, mas a depressão está associada a um maior risco de suicídio. Os pesquisadores estimam que cerca de 60% das pessoas que perdem a vida por suicídio tiveram um transtorno de humor, como depressão ou transtorno bipolar.3[Internet] Jedfoundation.org. Acesse o link.
A literatura mostra que a associação entre suicídio e transtornos mentais é de mais de 90%. O risco de suicídio ao longo da vida entre pacientes especificamente com transtorno depressivo não tratado é de quase 20% (Gotlib & Hammen, 2002), e de 43,2% se o quadro do paciente for de Depressão Maior (cerca de 43,2% dos casos).4[Internet] Pepsic.bvsalud.org. Acesse o link.
A dor da depressão pode causar suicídio?
A dor crônica pode levar à depressão (e ser exacerbada por ela), gerar desesperança, facilitar o desejo de fuga através da morte e corroer o medo natural de morrer.5[Internet] Pubmed.ncbi.nlm.nih.gov. Acesse o link. Talvez a melhor evidência de que a depressão é dolorosa, e também a mais trágica, é a de que um número impressionante de pessoas considera a dor tão intolerável que decide se “auto-eliminar” para acabar com o sofrimento. E assim desembocamos nesse episódio ingrato, do qual ninguém quer falar: o suicídio.
Suicídio é uma das maiores causas de mortalidade no mundo todo, em sua maioria acometendo adultos jovens. No Brasil, 24 pessoas cometem suicídio por dia.
Desde a sua inauguração em 2018, este blog vem postando matérias sobre depressão enquanto associada à dor crônica. A meu ver, as 7 postagens mais relevantes foram as seguintes:
Em todas essas postagens, talvez para preservar minha paz interior, nunca pensei em agregar o suicídio. É um erro, claro. Sofrer de depressão é involuntário, assim como o câncer ou o diabetes, mas é uma doença tratável e que pode ser controlada. Muitas pessoas que sofrem de depressão e que alimentam pensamentos suicidas não percebem isso e não procuram ajuda. As emoções e até a dor física podem se tornar insuportáveis. Essas pessoas não querem morrer, mas é a única maneira pela qual sentem que sua dor vai acabar. É uma escolha irracional que eventualmente pode ser desmantelada por um bom psicoterapeuta.
3 respostas
Realizo há mais de 20 anos tratamentos para dor crônica (fibromialgia) que posteriormente gerou a ansiedade e pouco tempo depois a depressão que me acompanha de forma latente até hoje. Anualmente os sintomas se agravam, dependendo do ambiente de trabalho. Quando o ambiente não está favorável, as dores e angústia voltam. Volto também a tomar remédios mas não está resolvendo mais. Qero somente trabalhar em um ambiente de tranquilidade e no período da manhã. Não posso trabalhar mais a noite, inclusive com pedidos médicos. Mas a administração de meu trabalho insiste em me enquadrar nas aulas noturnas. Estou piorando…
Olá Anselmo!
Pelo que vi você é da área da educação.
Sou psicólogo e tenho estudado bastante sobre o tema da dor crônica e seus efeitos na vida das pessoas. Sofro de dor crônica há mais de uma década e, em grande parte por questões relaconadas ao espaço laboral. Naturalmente não tenho informações a respeito do seu tratamento, mas possivelmente algumas mudanças comportamentais, q incluem o ambiente, poderão ajudar a lidar melhor com o quadro.
O tratamento adequado faz toda diferença e ele inclui: acompanhamento médico e psicológico, concomitantemente.
Espero que consiga reverter tanto quanto possível o quadro e que consiga lidar da melhor forma possível com a situação.
Grande abraço!!
Infelizmente, você não vai gostar da resposta. Se realmente seus sintomas se agravam, dependendo do ambiente de trabalho, e a limitação de horário imposta pelo seu emprego força ESSE ambiente de trabalho… o que pode ser dito ou feito? Parece-me que nada. De fato, a relação “ambiente de trabalho”/fibromialgia/depressão é inquestionável. O único que resta é confirmar seus diagnósticos. Os critérios de diagnósticos de fibromialgia, por exemplo, hoje não são os mesmos de há 20 anos. O diagnóstico de depressão quase sempre requer segundas opiniões. De qualquer forma, essas afirmações possuem base científica-médica e talvez justifiquem uma reivindicação de mudança de horário pela via legal.