Viver com dor pode ser difícil, especialmente se for uma dor crônica. A dor crônica é a dor que dura 3 meses ou mais. Pode fazer você dormir mal, sentir-se cansado e irritado e ter dificuldade em ser ativo ou trabalhar. Também pode prejudicar seus relacionamentos com entes queridos, tornando difícil ser quem você deseja ser. Pior ainda, estresse, ansiedade e depressão – a trilogia do Inferno, como eu a chamo – dificultam o controle de sua dor e, em último termo, podem piorar a dor e aumentar seu sofrimento. Aprender a controlar sua dor crônica ajuda com todas essas coisas. Assim sendo, na maioria dos casos, você pode preservar sua qualidade de vida. Esse controle, todavia, não pode ser feito com remédios, mas com a mente. A própria mente. Não, nada há de esotérico nisso, e sim, pura neurociência da dor.
“Uma mente negativa nunca lhe dará uma vida positiva”
Não, esta não é uma postagem do gênero autoajuda. Ao contrário, embora escrita em termos amenos e fáceis de entender, ela está baseada em pesquisas recentes relacionadas a neurociência. Segundo elas, elementos psicológicos e emocionais podem desempenhar um papel importante na dor crônica. Para bem ou para mal. Como a vida de quem tem dor crônica é atribulada, o “para mal” parece ocupar todos os espaços. Esses componentes não físicos costumam estimular o cérebro a “aprender” a sentir dor. Quando a pessoa pensa que nunca vai melhorar ou que a dor vai incapacita-la ou coisa pior, ela está obrigando o cérebro a lembrar disso, e a fortalecer uma maneira de pensar sobre a dor que é inútil e antiterapêutica – não sei se este último termo existe, mas você me entende. Contudo, hoje há evidências claras e robustas de que treinando o cérebro é possível conseguir o oposto: “desaprender” o processo doloroso. Como? Reconectando os circuitos neurais do corpo para diminuir as sensações de dor e trazer alívio. Nada fácil, mas possível.
Uma maneira de ajudar a controlar e lidar com sua dor é por meio de um pensamento saudável. Seus pensamentos são algo que você pode controlar. Você pode aprender técnicas para tornar seus pensamentos mais úteis e encorajadores.
No momento, as três mais importantes relacionadas a erradicação de pensamentos “tóxicos” sobre a dor são as seguintes:
- A terapia cognitivo-comportamental, também chamada TCC, é uma maneira de ajudá-lo a ficar bem e lidar com a dor, mudando a forma como você pensa. E como você pensa afeta como você se sente. Pensamentos negativos podem piorar o estresse e a dor. O pensamento saudável pode ajudar. A TCC costuma ser usada para ajudar as pessoas a pensar de maneira mais saudável e equilibrada. O objetivo é mudar a maneira como você pensa sobre a dor para que seu corpo e sua mente respondam melhor quando você sente dor.
- Outra técnica, chamada terapia de aceitação e compromisso (ACT), ajuda você a lidar com a dor crônica, ajudando você a aprender a aceitar sentimentos negativos. Você aprende a basear suas escolhas e ações em seus valores pessoais, e não em sentimentos negativos.
- A terapia de reprocessamento da dor (PRT) é um novo paradigma de diagnóstico e tratamento que ajuda os pacientes a desaprender a dor crônica retreinando seus cérebros. Um método fundamental é trabalhar diretamente com o medo da dor, que geralmente é o principal fator de sintomas. Um passo crítico para o PRT é diferenciar a dor estrutural da dor não estrutural ou primária. Muitos médicos e psicólogos da dor pulam essa etapa, mas ela é essencial para transformar a dor crônica.
O pensamento saudável pode remover as barreiras para ser fisicamente ativo, como pensamentos desencorajadores. Isso ajuda porque a dor também pode melhorar com atividades físicas, como caminhar e nadar.
Mudar seu pensamento levará algum tempo. Seja paciente consigo mesmo enquanto aprende a pensar de forma saudável. Pode não parecer certo no começo, porque você está tentando algo novo. Mas com a prática diária, ficará mais fácil e natural. E é algo que você pode começar a fazer hoje.
Como você pode usar o pensamento saudável para lidar com a dor?
Muitas pessoas trabalham com um terapeuta ou conselheiro para aprender técnicas de terapia cognitivo-comportamental. Como essa terapia visa ajudar a pessoa a mudar a maneira como ela pensa e se comporta em relação a dor, usualmente requer ajuda especializada e tempo – aproximadamente 8 a 12 sessões, uma ou duas vezes por semana. Não está, portanto, ao alcance do brasileiro típico. Por outro lado, é uma forma de psicoterapia que se baseia no conhecimento empírico da psicologia. Ou seja, se você for alfabetizado e se dispor a ler sobre o assunto, também pode seguir, sozinho, alguns protocolos baseados no bom senso.
Como por exemplo, o seguinte: | |
Parar | Observe seus pensamentos. Quando você notar um pensamento negativo, interrompa-o e anote-o. |
Perguntar | Olhe para esse pensamento e pergunte a si mesmo se é útil ou inútil. |
Escolher | Escolha um pensamento novo e útil para substituir um pensamento negativo. Pergunte a si mesmo: Que efeito a crença nesse pensamento tem sobre mim? O que poderia acontecer se eu o adotasse? |
O objetivo é fazer com que pensamentos encorajadores venham naturalmente até sua mente. Pode levar algum tempo para mudar a maneira como você pensa. Você precisará praticar o pensamento saudável todos os dias.
Observe e pare seus pensamentos
O primeiro passo é perceber e interromper seus pensamentos negativos ou “conversa interna”. Conversa interna é o que você pensa e acredita sobre si mesmo e suas experiências. É como um comentário contínuo em sua cabeça. Sua conversa interna pode ser racional e útil. Ou pode ser negativo e não útil.
Pergunte sobre seus pensamentos
O próximo passo é perguntar a si mesmo se seus pensamentos são úteis ou inúteis. A evidência apoia seu pensamento negativo? Algumas de suas conversas internas podem ser verdadeiras. Ou pode ser parcialmente verdadeiro, mas exagerado.
Aqui estão alguns tipos de pensamentos inúteis para procurar: | |
Focar no negativo | Isso às vezes é chamado de filtragem. Você filtra o que é bom e se concentra apenas no que é ruim. Exemplo: “Tive alguns dias bons, mas ter um dia bom não significa que terei mais.” Realidade: Assim como a vida, nem todos os dias são bons. Mas isso não significa que todos os dias serão ruins. Ter dias sem dor significa que você é capaz de tê-los, e ainda há mais pela frente. |
Eu deveria | As pessoas às vezes têm ideias definidas sobre como “deveriam” agir. Se você se ouvir dizendo que você ou outras pessoas “deveria” ou “tem que” fazer algo, então você pode estar se sentindo mal. Exemplo: “Se eu tomar todos os meus remédios conforme prescritos, não sentirei dor.” Realidade: Não há nada de errado em esperar que os remédios funcionem. Mas controlar a dor crônica às vezes requer muitos recursos diferentes, incluindo medicamentos, para obter os melhores resultados. |
Supergeneralização | Isso é pegar um exemplo e dizer que é verdade para tudo. Procure palavras como “nunca” e “sempre”. Exemplo: “Não há nada que eu possa fazer para aliviar a dor.” Realidade: Em alguns dias, a dor pode parecer insuportável. Mas insistir nisso faz com que você se concentre na dor, o que pode piorá-la. Em vez disso, tente se concentrar em maneiras de lidar com a dor. O que era diferente em tempos anteriores, quando a dor não era tão intensa? Como você lidou então? Algumas dessas estratégias podem ajudar? |
Pensamento tudo ou nada | Também é chamado de pensamento preto ou branco. Exemplo: “Tenho dificuldade em ficar sentado por muito tempo, então não posso voltar ao trabalho.” Realidade: Com um pouco de criatividade, você pode conseguir uma disposição alternativa de assentos ou um horário de trabalho flexível. Escolha seus pensamentos O próximo passo é escolher um pensamento mais útil para substituir o inútil. |
Manter um diário de seus pensamentos é uma das melhores maneiras de praticar parar, perguntar e escolher seus pensamentos. Isso o torna consciente de sua conversa interna. Anote quaisquer pensamentos negativos ou inúteis que você teve durante o dia. Se você acha que pode não se lembrar no final do dia, mantenha um bloco de notas com você para anotar quaisquer pensamentos inúteis à medida que eles acontecem. Em seguida, escreva uma mensagem útil para corrigir o pensamento inútil.
Com a prática diária, pensamentos mais precisos e úteis logo virão naturalmente para você.
Mas pode haver alguma verdade em alguns de seus pensamentos negativos. Você pode ter algumas coisas nas quais deseja trabalhar. Se você não teve um desempenho tão bom quanto gostaria em algo, anote isso. Você pode trabalhar em um plano para corrigir ou melhorar essa área.
Se quiser, você também pode escrever que tipo de pensamento inútil você teve. As entradas no diário podem ser algo assim:
Diário de pensamentos | ||
Pare seu pensamento negativo | Pergunte o tipo de pensamento negativo que você teve | Escolha um pensamento preciso e útil |
“Não senti muita dor hoje, mas sei que não vai durar muito”. | Focando no negativo | “Claro, nem todos os dias serão sem dor. Mas eu tive alguns dias sem dor ultimamente, então sei que nem todos os dias serão dolorosos”. |
“Tomei todos os meus remédios como deveria, então não devo sentir nenhuma dor”. | Deveria | “Os remédios ajudam muito, mas podem não resolver o problema sozinhos. Usá-los junto com um pensamento saudável me dá a melhor chance de lidar com a minha dor”. |
“Não há realmente nada que eu possa fazer para aliviar minha dor”. | Supergeneralizando | “Alguns dias minha dor pode parecer difícil de controlar, mas houve dias em que melhorou. E há coisas que posso fazer para aliviar minha dor”. |
“Sentar por mais de 2 horas é muito difícil, então não há como eu voltar ao meu trabalho”. | Tudo ou nada | “Talvez não consiga voltar ao meu trabalho exato, mas posso estar aberto a outros acordos que me permitam continuar a trabalhar de maneira semelhante”. |
Diário de pensamentos | |
Pare seu pensamento negativo | “Não senti muita dor hoje, mas sei que não vai durar muito”. |
Pergunte o tipo de pensamento negativo que você teve | Focando no negativo |
Escolha um pensamento preciso e útil | “Claro, nem todos os dias serão sem dor. Mas eu tive alguns dias sem dor ultimamente, então sei que nem todos os dias serão dolorosos”. |
Pare seu pensamento negativo | “Tomei todos os meus remédios como deveria, então não devo sentir nenhuma dor”. |
Pergunte o tipo de pensamento negativo que você teve | Deveria |
Escolha um pensamento preciso e útil | “Os remédios ajudam muito, mas podem não resolver o problema sozinhos. Usá-los junto com um pensamento saudável me dá a melhor chance de lidar com a minha dor”. |
Pare seu pensamento negativo | “Não há realmente nada que eu possa fazer para aliviar minha dor”. |
Pergunte o tipo de pensamento negativo que você teve | Supergeneralizando |
Escolha um pensamento preciso e útil | “Alguns dias minha dor pode parecer difícil de controlar, mas houve dias em que melhorou. E há coisas que posso fazer para aliviar minha dor”. |
Pare seu pensamento negativo | “Sentar por mais de 2 horas é muito difícil, então não há como eu voltar ao meu trabalho”. |
Pergunte o tipo de pensamento negativo que você teve | Tudo ou nada |
Escolha um pensamento preciso e útil | “Talvez não consiga voltar ao meu trabalho exato, mas posso estar aberto a outros acordos que me permitam continuar a trabalhar de maneira semelhante”. |