Hoje tem especialistas para tudo. Até no negócio da dor. Veja as razões do psicólogo para pleitear aqui o seu lugar ao sol.
“A dor é inevitável; o sofrimento é opcional.”
Num congresso interdisciplinar de dor acontecido recentemente, uma das sessões chamou a minha atenção: “Quando encaminhar o doente com dor crônica para um especialista em saúde mental?”
Que especialista seria esse? “Especialista em saúde mental” é o mesmo que “especialista em dor”? E qual a formação dele? Medicina, psiquiatria, psicologia? Ou seria essa uma especialidade dentro de qualquer uma dessas disciplinas?
Como essas questões permanecem sem resposta, passei a questionar se a intervenção desses profissionais seria mesmo necessária, para início de conversa. No caso de pacientes com dor crônica, mais precisamente. (Afinal, a dor aguda passa rápido, e talvez por isso, gera frustração, mas não desordens mais “pesadas” como ansiedade, abandono e depressão, característicos da dor crônica.)
Vejamos, a International Association for the Study of Pain define a dor como uma experiência sensorial e emocional. (Isso de “emocional” é relativamente recente: 1968, ano da publicação do paper de Ronald Melzack e Patrick Wall1“Pain Mechanisms: a New Theory”. Ronald Melzack and Patrick D. Wall. Science. 1965., apresentando a Teoria do Portão do Controle da Dor, a primeira em reconhecer as nuanças psicológicas da dor.) A psicologia, então, aparece na própria definição oficial de dor. O que, convenhamos, é ó óbvio do óbvio. Independentemente de onde você sente a dor, ela é produzido no cérebro, o local onde costumamos pensar e sentir. E hoje é sabido que pensar catastroficamente – “Vai acontecer o pior”, “Eu nada posso fazer”… – prediz a intensidade da dor, a necessidade de usar medicação tarja preta, o tempo de recuperação pós-operatória e, claro, as chances de se recuperar bem. Ou seja, se você pensou fatal, a sua dor vai piorar. Psicólogos ajudam a evitar isso (via Terapia Cognitiva Comportamental, por citar uma das opções).
E tem mais, ainda neurologicamente falando, sair da dor requer aprender sobre dor. Para que? Para regular melhor os pensamentos e emoções que colaboraram com a dor, em primeiro lugar. Ajudar o doente a modular sua dor e/ou seus efeitos através dessa regulagem, é tarefa para psicólogo, também.
Mas talvez a maior alavancagem para um profissional como esse no campo do gerenciamento da dor seja o fracasso da medicina convencional no que se refere a prevenir ou reabilitar dores crônicas. Em países que possuem estatísticas confiáveis, como EUA, Reino Unido, Suécia e Austrália, entre 30 e 40% da população convive com elas. E elas custam à sociedade mais do que doenças cardíacas, diabetes e câncer – juntas.A esse passo, apenas nos Estados Unidos, em menos de 10 anos a conta crava US$ 1 trilhão. (Incluindo incapacidade e improdutividade no trabalho, hoje está em $635 bilhões. Faça as contas.)
APRENDER SOBRE DOR
Por outro lado, a dor crônica nas costas atualmente está aos poucos sendo vista como uma doença do sistema nervoso, e não da espinha dorsal, como o foi durante décadas. Isso faz uma enorme diferença quanto a natureza e a condução profissional do tratamento: o melhor tratamento há de ser o menos invasivo, e neurocientistas e psicólogos especializados em dor passam a ser mais procurados que os cirurgiões.
“A dor crônica persiste porque até hoje os tratamentos têm sido inadequados. A dor responde significativamente à psicologia e ao modo de pensar (mindset) de cada pessoa, e isso apresenta uma oportunidade.”
Uma oportunidade? Pode ser – em países desenvolvidos e olha lá. O gerenciamento da dor, e muito menos a psicologia subjacente, são tenuemente ensinados em pouquíssimas universidades do mundo ocidental (do oriental não saberia dizer). Especialistas em psicologia da dor de fato existem, mas são escassos e precisam ter doutorado em psicologia clínica e pós-doutorado em dor crônica. Em geral eles trabalham parcialmente em clínicas de dor, hospitais ou clínicas de reabilitação, integrando equipes multidisciplinares.3[Internet] psychologytoday.com. Acesse o link
Isso, repito, em países como EUA, Austrália etc. Noutras latitudes menos abençoadas, a situação é bem distinta. Na América do Sul, por exemplo,descobrir uma clínica de dor – uma clínica de dor de verdade, note-se – é um achado.
Nota do blog
Apenas para satisfazer a curiosidade mórbida de alguns: nos Estados Unidos o salário médio de um Psicólogo da Dor é pouco menos de US$ 100 mil/ano, ou 58% maior que a média salarial de vagas abertas no país, ou a metade da média salarial de um psiquiatra.4[Internet] mastersinpsychologyguide.com. Acesse o link
Uma resposta
Tudo que está escrito neste blog, expressa o meu dia a dia com DOR AGUDA CRONICA.
DIZER, “EU TENHO DOR CRÔNICA”, É OFENDER O PRÓXIMO, BULLYING.?