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O cannabis médico para a dor crônica – Parte 2

Cannabis

Semana passada eu comentei que o cannabis medicinal era, entre outras coisas, diferente da maconha e apontei algumas de suas contribuições à saúde já validadas cientificamente. Pelos comentários recebidos, todavia, penso que eu devia ter começado voando mais baixo. Pelo be-a-bá do tema. Não quero desrespeitar ninguém, mas o nível de desinformação – e de preconceito, aliás – a respeito é profundo. E superficial demais. Resolvi, então, postar algo para quem deseja se informar preliminarmente sobre o cannabis medicinal.

“A ilegalidade do cannabis é ultrajante, um impedimento à plena utilização de uma droga que ajuda a produzir a serenidade e o discernimento, a sensibilidade e a camaradagem tão desesperadamente necessários neste mundo cada vez mais louco e perigoso.”

– Carl Sagan

“A grande maioria do uso de cannabis é para fins de bem-estar. A exceção à regra é o uso indevido; qualquer material psicoativo pode e será problemático para alguma porcentagem da população – incluindo o cannabis.”

– Steve DeAngelo

Uma visão rápida e precisa do tema é dada pelo resumo do USO INDEVIDO E DEPENDÊNCIA DE OPIOIDES: DA PREVENÇÃO AO TRATAMENTO, publicado no ano passado na Revista de Medicina de Família e Saúde Mental (Editora UNIFESO).

Outras referências úteis e um vídeo são disponibilizados no fim desse post.

Autores: Jason W Busse e outros

Parte 2

Cannabis para curiosos e desavisados

O ópio é fabricado a partir da extração da papoula (Papaver somniferum)1. Seu uso foi reconhecido como narcótico por Hipócrates em 460 a.C.; em 1803, Friedrich Sertürner sintetizou a morfina, e em 1843, foi descoberto sua administração injetável pelo médico Alexandre Wood2. Dessa maneira, o uso do ópio acompanhou o desenvolvimento da civilização3.

Os opiáceos são classificados em

  • naturais, substâncias extraídas diretamente do cálice da papoula;
  • semissintéticos, sendo a heroína (diacetilmorfina) o primeiro descrito na literatura médica por Wright, em 1874; e
  • sintéticos4.

Os medicamentos opioides são medicamentos prescritos para o tratamento e alívio da dor. Dizem-se por esta razão que são medicamentos analgésicos. São medicamentos úteis no alívio de dor, mas também não são isentos de riscos.

Existem vários medicamentos opioides e em formatos diferentes (comprimidos, cápsulas, adesivos/emplastros, gotas, spray etc.). Apenas pode se tomar estes medicamentos quando prescritos por um médico, após um diagnóstico clínico e na presença de uma dor moderada a forte.

Apesar de os opioides e os opiáceos serem substâncias de origem e estruturas diferentes, eles possuem ações e efeitos clínicos semelhantes5. Atuam em receptores opioides específicos pré e pós-sinápticos e geralmente são encontrados no sistema nervoso central (cérebro e medula espinhal) e no sistema periférico6.

Os opioides são substâncias fabricadas em laboratório, sintéticas, conhecidos por causar narcose devido sua ação analgésica e hipnótica7.

A “Crise dos Opioides” foi iniciada pela prescrição excessiva e indiscriminada destas medicações para o tratamento da dor8. A junção desses fatores propicia a dependência, overdose e até mesmo óbito, e em algumas vezes sem a obtenção da eficácia analgésica9. Desde o final dos anos 90, nos Estados Unidos, a prevalência do uso e abuso de opioides sob prescrição médica aumentou dramaticamente, sendo declarada uma epidemia de overdose no país101112.

Estima-se 12 a 21 milhões de usuários no mundo inteiro, sendo que três quartos deles usam heroína e 80% dos consumidores são americanos13. As vendas dessas medicações cresceram cerca de 149% em 10 anos.

Já no Brasil, um levantamento revelou que 1,3% da população faz uso de opioides e a incidência de heroína é de 0,09%14. O país é o maior consumidor de analgésicos opioides da América do Sul15. O risco de uso e dependência está limitado a pessoas que desenvolvem dependência após tratamento médico e aos profissionais de saúde que possuem acesso à droga16. A taxa do uso nocivo entre médicos é estimada em 4% e a dependência em 22,7%17.

Entre os fármacos mais procurados de maneira ilícita estão a oxicodona e a hidrocodona, com maiores proporções que a morfina e fentanil. Em contrapartida, entre usuários de rua, a metadona é a mais vendida.181920

Diversos fatores de risco foram implicados na dependência de opioides, e incluem idade entre 18-24 anos; sexo masculino; queixa subjetiva de dor em várias partes do corpo; histórico anterior de abuso de álcool, cannabis ou drogas ilícitas; presença de transtornos psiquiátricos; uso de psicotrópicos; aumento do grau de tolerância à dor; antecedente criminal e tabagismo, entre outros.2122

O Cannabis e o Tratamento da Dor

Nas décadas passadas, médicos foram duramente criticados por subtratar a dor23. Após ser considerada como o “quinto sinal vital”, a abordagem do estímulo álgico passou a ser agressivamente questionada24. Nos primeiros anos da “Crise dos Opioides”, milhares de mortes foram causadas nos EUA e na Europa pelo uso indevido de analgésicos prescritos, heroína, além dos opioides sintéticos, responsáveis hoje por grande parte dos óbitos.252627

Drogas opioides, contudo, exercem efeitos farmacológicos envolvendo o sistema opioide endógeno, onde atuam como agonistas de diversos receptores, levando à analgesia e efeitos recompensadores. Esses receptores estão presentes em diversas regiões do sistema nervoso central que regulam as emoções e o comportamento. Por um lado, o cannabis age na modulação da dor, o que é benéfico; mas por outro lado, pode gerar ansiedade, depressão e adição.

Diante do exposto, os formuladores de políticas de saúde tentam minimizar os efeitos deletérios do aumento ao acesso aos opioides prescritos, garantindo que a dor seja devidamente abordada28. (Veja “Três fontes básicas” logo abaixo)

Um primeiro passo nessa direção é informar a população sobre todo o anterior e muito mais. Muita gente confunde maconha com cannabis, e imagina ambos num contexto recreativo e não medicinal. É uma forma de estigmatizar o cannabis, ao invés de considerá-lo como uma opção promissora para o manejo da dor aguda e crônica. A meu ver, as melhores fontes para se informar desse ângulo são as seguintes:

Três fontes básicas:

  • Opium and opioids: a brief history”, Danilo Freire Duarte. Revista Brasileira de Anestesiologia 2005
  • Opioids”, National Library of Medicine dos Estados Unidos.
  • Cannabis e Cefaleia”. Videoaula ministrada pelo Dr. Jaime Olavo Marquez, neurologista e ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Estudos da Dor, cedida especialmente para reprodução neste blog.

Reproduzir Vídeo Sobre CANNABIS por Dr Jaime Olavo Marquez
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