Conheça mais um post da nossa série sobre DEPRESSÃO, com a opinião do quinto dos 17 médicos espalhados pelo mundo que respondem à pergunta sobre se ela é mesmo curável. Aqui, a opinião do Dr. Rodrigo del Córdoba Rojas, da Colômbia.
“Nada expõe tanto o psiquiatra ao descrédito e fracasso quanto o tratamento para a melancolia, uma síndrome que em muitos casos é mais rebelde à terapia.”
A depressão é curável? Pergunta mais incômoda que essa deve haver poucas. Para o profissional da saúde – e não somente um psiquiatra – que se vê impotente diante de um paciente ansioso. E também para este último, ao perceber que provavelmente a resposta desejada nunca virá. (Ou pior ainda, ao perceber meses depois que ela veio errada.)
A pergunta em questão foi respondida por 17 médicos clinicando em países diferentes, da Alemanha à Armênia, e entre eles, o Brasil.
E por que é interessante para alguém com dor crônica conhecê-las?
Porque a depressão e a dor crônica, é sabido, costumam andar juntas. E a dor crônica é o assunto do blog.
Já foram publicados as quatro primeiras opiniões a respeito – do Dr. Tunç Alkin (Turquia), do Dr. Eugene Allers (África do Sul), do Dr. CM Banki (Hungria) e do Dr. Bauer (Alemanha). Pelas próximas semanas, continuarei postando uma dessas 17 respostas médicas por vez. Pode ficar meio monótono. Mas nem tanto quanto passar pela farmácia a comprar um antidepressivo que talvez nem seja necessário.
DEPRESSÃO: NÃO É CURÁVEL, MAS É TRATÁVEL.
O escopo clínico da tristeza em humanos é debatido há muito tempo. Após o desenvolvimento das classificações psiquiátricas modernas em 1980, a tristeza em humanos agora é reconhecida como uma condição clínica associada a outros sintomas e mudanças no funcionamento pessoal, familiar e social, chamado transtorno depressivo maior. Mas considerá-lo uma entidade única que compreende todo o conceito de depressão é difícil, e isso levou a uma ampla discussão clínica, variando desde os diferentes espectros ou a distinção entre depressão unipolar/bipolar até a expressão da ansiedade. Esse quadro clínico heterogêneo conduziu a pesquisa a identificar biomarcadores e levou ao desenvolvimento de testes de diagnóstico, como o teste de supressão da dexametasona ou o teste de supressão do hormônio tireoidiano. A baixa homogeneidade, que está ligada à variabilidade individual dos seres humanos, é uma grande preocupação nos diagnósticos psiquiátricos.
A depressão é um problema de saúde pública em todo o mundo com alta taxa de prevalência e foi identificada como a quarta condição médica principal que contribui para a carga global da doença.1Ferrari AJ, Charlson FJ, Norman RE, et al. Burden of Depressive Disorders by Country, Sex, Age, and Year: Findings from the Global Burden of Disease Study 2010. PLoS Med. 2013;10(11):1-12. O transtorno depressivo maior também é cada vez mais reconhecido como uma condição recorrente e potencialmente crônica e incapacitante. Um grande estudo nos EUA (STAR * D [alternativas de tratamento sequenciado para aliviar a depressão]) relatou taxas de resposta em termos de efetividade do primeiro tratamento próximo a 40%,2Gaynes BN, Dusetzina SB, Ellis AR, et al. Treating depression after initial treatment failure: Directly Comparing Switch and Augmenting Strategies in STAR*D. J Clin Psychopharmacol. 2012;32(1):114-119. enquanto estudos de acompanhamento na América do Norte3Kessler RC, Berglund P, Demler O, et al. The epidemiology of major depressive disorder. Results from the national comorbidity survey replication (NCS-R). JAMA. 2003;289:3095-3105. e Suíça4Angst J, Dobler-Mikola A. The Zurich Study – a prospective epidemiological study of depressive, neurotic and psychosomatic syndromes. IV. Recurrent and non-recurrent brief depression. Eur Arch Psychiatry Neurol Sci. 1985;234(6): 408-416. permitem inferir que até 60% de todos os pacientes que sofrem de um episódio terão episódios subsequentes e sofrerão um declínio na saúde e no funcionamento. Cada novo episódio depressivo está associado a um risco renovado de episódios futuros e comprometimento funcional. Cada episódio parece aumentar a probabilidade de recorrências subsequentes. Estudos publicados sugerem que 30% a 50% dos pacientes atingem apenas remissão parcial de um episódio depressivo. Mesmo se houver alguns fatores de risco que possam nos ajudar a prever a recorrência do distúrbio – como histórico familiar de distúrbios afetivos, sexo feminino, início antes dos 25 anos, recorrência anterior, estilos cognitivos negativos, exposição a eventos estressantes da vida, ausência de apoio social (especialmente em mulheres) e comorbidade5Kendler KS, Thornton LM, Gardner CO. Genetic risk, number of previous depressive episodes, and stressful life events in predicting onset of major depression. Am J Psychiatry. 2001;158(4):582-586. – eles também não conseguem prever com absoluta certeza a recorrência da doença.
Portanto, é provável que entre 30% e 50% dos pacientes sofram apenas um episódio na vida. Para este grupo de pacientes, a depressão é realmente curável. No entanto, essa afirmação é problemática, pois não há testes para identificar quem se recuperará e quem terá que continuar lutando contra a depressão crônica ou episodicamente. O conceito de remissão no tratamento de pacientes depressivos ganhou atenção crescente na última década e agora é o objetivo aceito do tratamento agudo da depressão. Com essa limitação, a abordagem atual baseia-se em intervenções gerenciadas em fases, onde três fases são geralmente distintas: gerenciamento agudo, continuação e manutenção. O gerenciamento agudo se concentra no uso de terapia medicamentosa, psicoterapia, terapia eletroconvulsiva ou uma combinação deles. A fase de continuação visa consolidar a resposta obtida e alcançar a remissão completa dos sintomas e a prevenção de recaídas, e normalmente leva entre 4 e 6 meses. A manutenção é direcionada aos pacientes com três ou mais episódios de depressão ou dois episódios graves que podem precisar ser mantidos com antidepressivos por um período prolongado ou mesmo indefinidamente.6Rapaport MH. Beyond acute treatment of depressive disorders. J Clin Psychiatry. 2009;70(7):e21. unipolar major depressive disorder. Arch Gen Psychiatry. 2000;57: 375-380.
A depressão é tratável e não curável. A mensagem responsável para o paciente e para a comunidade médica em geral é enfatizar a importância de obter tratamento e mantê-lo ao longo do tempo como um meio de remissão completa e recuperação pessoal, familiar e social.