A essa altura é sabido que pessoas que foram hospitalizadas por conta da Covid-19 são propensas a desenvolver ou ter sintomas persistentes além das manifestações respiratórias – neurológicas, cognitivas, psicológicas, cardiovasculares, metabólicas gastrointestinais, anemia e problemas de coagulação do sangue, bem como fadiga e mal-estar – semanas ou meses depois da alta. É a chamada Covid Longa. Pacientes que não estavam doentes o suficiente para serem hospitalizados ainda tinham um risco significativamente maior de morrer em seis meses do que pessoas não infectadas.
“Sem tratamento, alguns long-haulers podem ficar nesse estado a vida toda.”
Nota do blog:
Primeiro pensou-se que a imunidade natural de quem fosse pego pelo novo coronavírus o protegeria 100% por pelo menos um ano (como no caso da gripe). Não foi o caso. Há reinfecções e o prazo de validade dessa imunidade ainda é incerto. Depois foi imaginado que, uma vez curada, a Covid-19 não teria sequelas. Paciência, de fato ela tem. Sequelas, quero dizer. Por fim, apostou-se em que essas sequelas somente afetariam quem já tivesse sido hospitalizado e, de preferência, sobrevivido a uma temporada na UTI. Errado, de novo. Hoje há evidências de que uma espécie de “efeito retardado da Covid-19” pode atingir desde os que experimentaram sintomas leves aos assintomáticos.
Os efeitos do Covid-19 na saúde não apenas podem se estender por meses, mas parecem aumentar o risco de morte e condições médicas crônicas, mesmo em pessoas que nunca ficaram doentes o suficiente para serem hospitalizadas, concluiu um grande estudo.
No estudo, publicado na revista Nature, os pesquisadores analisaram registros médicos de mais de 73.000 veteranos americanos cujas infecções por coronavírus não exigiram hospitalização.
Entre um e seis meses após a infecção, esses pacientes tinham um risco significativamente maior de morte (60% maior) do que as pessoas que não haviam sido infectadas com o vírus.
A pesquisa também descobriu que os sobreviventes não hospitalizados da Covid tinham uma chance 20% maior de necessitar de cuidados médicos ambulatoriais durante esses seis meses do que as pessoas que não contraíram o coronavírus.
Os sobreviventes da Covid experimentaram uma vasta gama de problemas médicos crônicos que eles nunca tiveram antes – não apenas problemas pulmonares, mas sintomas afetando qualquer sistema orgânico ou parte do corpo, desde neurológico cardiovascular até gastrointestinal. Eles também corriam maior risco de ter problemas de saúde mental, incluindo ansiedade e distúrbios do sono.
Além do mais, alguns dos problemas médicos pós-Covid dos pacientes – como diabetes, doenças renais e alguns problemas cardíacos – poderiam se tornar condições crônicas exigindo tratamento pelo resto da vida.
“(A Covid) não foi embora. E ainda não entendemos a causa subjacente, e ela se tornou crônica em alguns casos, incapacitante em outros. Em algumas áreas, as pessoas melhoraram, mas é muito variável.”
Os pesquisadores não puderam dizer se as pessoas tinham problemas de saúde subjacentes e se seus novos sintomas eram efeitos diretos da infecção por coronavírus, efeitos corolários de medicamentos que estavam tomando para tratar alguns dos sintomas, estresse de outros problemas relacionados à pandemia ou outras influências.
As descobertas do estudo refletem uma série de problemas causados não apenas pelo vírus em si, mas pela luta do sistema médico para lidar com a Covid-19 e seus efeitos de longo prazo.
Em muitos casos, as pessoas com novos sintomas que nunca ficaram gravemente doentes devido à infecção viral entram em um mundo médico confuso e departamentalizado, onde primeiro procuram a ajuda de médicos de cuidados primários e, em seguida, são encaminhadas a vários especialistas que tentam descobrir como tratar as condições que se enquadram na área específica de especialização de cada qual.
Por exemplo, um endocrinologista vai olhar para o açúcar no sangue, não vai olhar para os outros 14 sistemas orgânicos. Mas o problema com o açúcar no sangue pode ser porque essa pessoa tem tanta fraqueza que não consegue ir ao supermercado comprar alimentos saudáveis, e então pede uma pizza!
“Tenho pacientes que saem da cama por 10 minutos para preparar uma salada e não conseguem comer porque estão totalmente exaustos, muito cansados quando fazem uma pequena salada”, disse o Dr. Al-Aly, do St. Louis Health Care System e coautor do estudo.
Os sobreviventes da Covid também estão mais propensos a tomar uma variedade de medicamentos para seus problemas de saúde recém-surgidos, incluindo opioides, o que pode prenunciar outra onda de problemas de dependência de opioides no futuro.
A análise dos registros de 13.654 pacientes que foram hospitalizados por causa da infecção inicial por coronavírus revelou que nos que precisavam de cuidados intensivos, o risco de complicações de longo prazo era maior. Depois vinham os pacientes hospitalizados em enfermarias, seguidos pelos que nunca foram hospitalizados.
No entanto, todas as categorias de sintomas – de dor no peito a falta de ar, diabetes a fraqueza muscular – foram sentidas por pelo menos algumas das pessoas que nunca foram hospitalizadas, que são a maioria.